«Pensar (Compreender) é difícil, por isso é que a maioria das pessoas julga.» (Frase comumente associada a Carl Jung)
«Facilmente se considera que não tem lógica, uma lógica que poder-se-á ainda não ter compreendido.» (Individualogia, 2019).
Julgar é “fácil”. Eu distingo julgar de criticar, de analisar, de concluir. Ainda mais de pensar. É muito comum as pessoas julgarem aquilo que conhecem, mais ainda aquilo que desconhecem. É muito comum, as pessoas julgarem algo, sendo muito contra ou a favor de algo, por exemplo, desconhecendo quase totalmente. É mais comum uma pessoa querer julgar algo do que querer compreender algo. A compreensão pode dar muito trabalho, pode ser muito desconfortável, pode não ser tão imediato, por isso é que na maioria das vezes se julga, e muito preconceituosamente.
É muito frequente uma pessoa julgar que algo não tem lógica nenhuma, mas se uma pessoa lhe perguntar o que sabe exatamente acerca daquilo que julga, ela não sabe responder, ou simplesmente a sua resposta é bastante insuficiente. É o problema do “imediatismo” a par com o problema do julgamento. Isto é também o problema do ego. Tem como radicalidade o problema do ego. Do imediatismo do ego. Da busca pelo mais fácil e confortável na imediatidade do ego. O nosso ego quer conforto intelectual, não quer “trabalho intelectual”. O nosso ego quer julgar. Quer poder. Faz com que uma pessoa se queira sentir poderosa e imprescindível, faz com que uma pessoa se queira sentir “superior”. Sempre que uma pessoa julga, no fundo, quer-se sentir segura, poderosa, superior e imprescindível. Se uma pessoa julga uma perspetiva diferente, contrária e contraditória, relativamente à sua, de forma precipitada e preconceituosa, ao invés de dedicar tempo para a tentar estudar e compreender, e eventualmente ter de se colocar em causa, ter de se questionar, fá-lo porque, de forma inconsciente, procura o “conforto” na imediatidade. Como é mais fácil simplesmente julgar, realizar a sentença, finalizar e fechar, na imediatidade, do que dar-se ao trabalho (“desconfortável”) de estudar e, ao aprender eventualmente uma coisa nova, poder ter de colocar em causa o próprio sistema de crenças, prefere fazê-lo (julgar). E porque não? Pensa o ego. Pois. O nosso ego não se interessa pela Verdade, pela Compreensão, propriamente. Prefere o conforto. As suas prioridades giram à volta do conforto na imediatidade. Não giram à volta de algo nobre, como a ética, e outras questões filosóficas por excelência. Isto tem também tudo a ver com o efeito Dunning-Kruger. A incapacidade de metacognição, a incapacidade de se admitir a própria incompetência, a própria limitação, a própria ignorância.
A pessoa que julga, preconceituosamente e precipitadamente, acha sempre que está em condições para o fazer, acha sempre que sabe o suficiente para o fazer. Muito dificilmente tem humildade e autoconsciência para admitir que não sabe o suficiente para julgar. Por vezes está a julgar, mas prefere acreditar que aquilo que está a fazer é apenas opinar. Também existe esta autoilusão. Há pessoas que ainda se dão a algum trabalho para tentar compreender algo ou alguém, mas desistem rápido. Outras ainda se dedicam muito, mas, quando é que uma pessoa está mesmo em condições de julgar seja o que for, nomeadamente alguém, taxativamente? Creio que talvez nunca. É preciso muita humildade para se poder chegar a esta conclusão. Com efeito. Sem ilusões. Pois há muitas pessoas que fazem de tudo para parecerem humildes aos olhos dos outros, porque querem ser vistas como santas, no entanto passam a vida a julgar. Pois vêm a humildade como virtude moral. E é. Mas há uma grande diferença entre ser-se humilde, e parecer-se humilde. Há pessoas que o são e não o parecem, e pessoas que o parecem, mas não o são. Por causa das máscaras sociais. A humildade vê-se, por exemplo, na relação das pessoas umas com as outras, na capacidade de se colocarem em “pé de igualdade”. De aprenderem umas com as outras. De se colocarem em causa e de se questionarem. Uma pessoa sem humildade dificilmente reconhece as suas limitações, dificilmente reconhece a própria ignorância, e facilmente se eleva a condição de superioridade, a “dona da razão”.
Quando as pessoas conversam umas com as outras, e entram num diálogo racional, num debate dialético, expondo e trocando ideias, crenças, principalmente existindo a alteridade intelectual, as pessoas que mais se impõem, que mais criam conflito, não são apenas as mais convictas, poderão ser as pessoas menos humildes. É a falta de humildade que, por norma, não permite que uma discussão possa acontecer de forma positiva, construtiva, produtiva e saudável. Apesar de haver outras variáveis, a humildade é certamente importante. Humildade para se reconhecer os próprios preconceitos. Para se perceber que não se é ninguém para se andar sempre a julgar os outros. Criei os «princípios fundamentais da lógica», na minha toeira da logicidade, (importante, ler a minha obra “Filosofia aplicada à consciência e felicidade”), em parte, para se evitar realizar precipitadamente e preconceituosamente os juízos lógicos, os “julgamentos lógicos”.
Ora, se uma qualquer logicidade, se uma qualquer ideia em que se quer perceber a sua lógica, só se “sustenta pela totalidade” (um dos princípios fundamentais), eu só poderei julgá-la lógica se conhecer a sua totalidade. E quando é que alguém conhece a totalidade de seja o que for? Pois. Na maioria das vezes, para não dizer sempre, não se conhece a totalidade de algo, portanto, há sempre ignorância, não havendo omnisciência. O que leva à conclusão de que “nunca” se deve julgar. Dentro deste enquadramento conceptual. Então porque é que as pessoas julgam tanto? Porque, na maioria das vezes, vivem na ilusão de uma falsa omnisciência. Porque vivem presas a um imediatismo intelectual. A uma incapacidade de admitirem a própria ignorância. A própria falibilidade. A ideia é: Sou falível logo não devo julgar. Sendo sempre preferível dedicar mais tempo, energia, recursos, para se tentar compreender seja o que for, deixando sempre algo em aberto, do que para se julgar. Num imediatismo decadente. Antifilosófico.
Capítulo da obra “Reflexões filosóficas sobre a felicidade Todos os Volumes” (Chiado Books, 2021). Autor Filipe Calhau.
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Filipe Calhau é natural de São João da Madeira e residente com raízes familiares em Vagos. É licenciado em Filosofia pela Universidade de Coimbra. É consultor filosófico. É ativista filosófico e para uma pedagogia da felicidade. Membro da APAEF – Associação Portuguesa de Aconselhamento Ético e Filosófico, onde dá formação certificada em Individualogia. Foi conferencista na 5ª edição do Seminário de Estudos sobre a Felicidade, com o tema: “Ética a Nicómaco”, realizado na Universidade Católica Portuguesa a 29 de maio de 2019. Investigador integrado no projeto “Perspetivas sobre a felicidade”, Contributos para Portugal no WHR (ONU). Tem um canal de filosofia no YouTube e várias obras publicadas na área (18 obras ao todo, publicadas em Portugal e no Brasil).