Uma proposta de Celebração de um Contrato-Programa de Desenvolvimento Desportivo com a Associação Académica de Coimbra – Organismo Autónomo de Futebol (AAC-OAF), “que permita a este Organismo de Futebol continuar a beneficiar da utilização gratuita do Estádio Cidade de Coimbra” (ECC), vai à Reunião de Câmara da próxima segunda-feira, dia de 22 de julho, para “debate e eventual deliberação”. Ao longo dos últimos meses, o Município de Coimbra tem desenvolvido “todos os esforços para alcançar uma plataforma de entendimento comum que permitisse, sem comprometer o interesse público e sem violar a lei aplicável, a celebração de um novo acordo com a AAC-OAF”. Todavia, a celebração de um novo Contrato-Programa está ainda dependente da apresentação, por parte da AAC-OAF, de um programa de desenvolvimento desportivo. A proposta de celebração do novo contrato-programa foi baseada num parecer do reconhecido jurista, especialista na Área do Direito Administrativo, Pedro Gonçalves. A utilização gratuita do ECC por parte Clube União 1919 ou outros clubes do concelho de Coimbra, bem como a clarificação da utilização do Estádio para grandes eventos são algumas das novidades da proposta do novo acordo.
Na Reunião de Câmara de 19 de junho de 2023, foi aprovada, por unanimidade, uma proposta de denúncia formal do Acordo de Utilização do Estádio Cidade de Coimbra, celebrado entre o Município e a AAC-OAF, “a fim de se poder iniciar tranquilamente uma renegociação legal e justa do mesmo”, bem como “devendo o Município de Coimbra, na qualidade de legítimo proprietário e entidade responsável pelo ECC, exercer uma maior supervisão sobre a utilização do equipamento”.
Nesse sentido, ao longo dos últimos meses, têm decorrido vários momentos com a AAC-OAF, traduzidos em várias reuniões e diversas trocas de e-mail, em que o Município “desenvolveu todos os esforços para viabilizar um acordo justo e equilibrado do ponto de vista das conveniências das partes e, sobretudo, que respeitasse o atual ordenamento jurídico, distinto daquele que vigorava no passado, que, nos termos do nº 2 do artigo 46º da Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto (Lei nº 5/2007, de 16 de janeiro, na sua redação atual), impede expressamente as autarquias locais de atribuir apoios ou comparticipações financeiras, sob qualquer forma, a clubes desportivos de caráter profissional”.
Assim, de forma a “perceber melhor o alcance legal da sua atuação” e em que “moldes poderia ser celebrado um eventual novo acordo”, o Município de Coimbra despoletou um procedimento destinado à contratação de um parecer jurídico a Pedro Gonçalves, professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e reconhecido jurista, especialista na Área do Direito Administrativo. Com base nas conclusões deste parecer foi elaborada uma proposta de minuta de Contrato-Programa de Desenvolvimento Desportivo, que obteve o parecer favorável da Divisão de Assuntos Jurídicos e Contencioso da Câmara Municipal (CM) de Coimbra.
Essa proposta, apresentada à AAC-OAF em junho, plasmava o parecer de Pedro Gonçalves que foi claro e inequívoco de que as receitas decorrentes do arrendamento dos espaços do ECC, a reverter para a AAC/OAF, deveriam constituir contrapartidas de interesse público. Ou seja, a minuta de acordo elaborada pelos serviços municipais, referia que “o Município de Coimbra atribui à Segunda Outorgante o direito de gestão comercial dos espaços afetos ao desenvolvimento de atividades comerciais e serviços”, sendo que “as receitas provenientes da rentabilização dos espaços comerciais do Estádio (…) bem como as receitas provenientes do nome do Estádio e as receitas provenientes de cedência da cobertura do Estádio são tidas como contrapartidas devidas pelas obrigações assumidas no âmbito deste contrato, por forma a comparticipar os avultados encargos e sobrecustos relacionados com a manutenção e conservação do Estádio”. “As receitas referidas no número anterior destinam-se, única e exclusivamente, a comparticipar os encargos e sobrecustos relacionadas com a manutenção e conservação do Estádio, não podendo as mesmas ser aplicadas para outros fins que não aqueles a que se destinam e, em circunstância alguma, para financiar custos ou encargos relacionados, direta ou indiretamente, com a sua atividade desportiva”, clarifica a minuta, que acrescenta que a AAC/OAF fica obrigada a apresentar um relatório anual “onde deverá informar, com detalhe, a receita apurada resultante da gestão dos espaços comerciais cedidos, a receita proveniente do nome do Estádio e as receitas provenientes de cedência da cobertura do Estádio, comprovando a afetação de tais verbas aos custos de manutenção e conservação do Estádio, incluindo obras, se, e quando necessárias”.
O principal ponto de discórdia entre o Município de Coimbra e a AAC/OAF residiu, precisamente, na afetação das receitas provenientes do arrendamento de espaços do ECC à manutenção e à conservação do mesmo. A AAC/OAF pretende dispor das receitas provenientes do arrendamento de espaços do ECC para investimento na prática desportiva, o que colide com a lei.
Assim, na última semana, e uma vez que a lei não permite às autarquias a atribuição de apoios financeiros a clubes desportivos participantes em competições desportivas de natureza profissional, a AAC-OAF referiu que, para além da participação em competições desportivas da 3º Liga, também desenvolve outo tipo de atividade, relacionadas com a sua natureza e missão desportiva, como os escalões de formação (sub 7 a sub 15) e o futebol feminino (única equipa sénior existente no Concelho). Nesse sentido, os juristas do Município “admitem que possa haver uma margem negocial que permita ao Município de Coimbra celebrar com a AAC-OAF um Contrato-Programa de Desenvolvimento Desportivo, onde fique contemplada a intenção manifestada pela AAC-OAF, no sentido de as receitas cobradas pela gestão e rentabilização dos espaços comerciais do ECC (caso não sejam todas gastas na manutenção do Estádio) possam ser, eventualmente, canalizadas para outros fins, nomeadamente para financiar despesas relacionadas com as atividades dos Escalões de Formação e/ou do Futebol Feminino”. Todavia, esta possibilidade só se concretiza, tal como plasmado na lei, caso a AAC-OAF apresente um Programa de Desenvolvimento Desportivo, “detalhado e fundamentado”, o que não aconteceu até ao momento, nem para a manutenção do Estádio nem para as atividades de formação e de futebol feminino.
Assim, esta proposta é apresentada em reunião de Câmara, tal como referido pelo despacho do presidente José Manuel Silva, para “debate e eventual deliberação”.
Nesta nova proposta há ainda outras novidades, designadamente o facto de a AAC/OAF ficar obrigada a conceder gratuitamente, “ao Clube União 1919 ou a outros clubes do concelho de Coimbra, o direito de utilização do equipamento desportivo – designadamente para a realização de jogos de futebol que se enquadrem no âmbito da atividade desportiva desenvolvida por estes clubes –, desde que as datas pretendidas não colidam com os jogos oficiais da AAC/OAF, ficando os clubes responsáveis pela bilheteira, por todos os custos associados e por eventuais danos ocorridos durante a realização do evento, devendo subscrever a adequada apólice de seguro”.
Também a disponibilização do ECC para a realização de grandes eventos foi clarificada nesta nova proposta, pois a AAC/OAF não poderá “exigir ao Município de Coimbra ou à entidade promotora responsável pelo(s) evento(s) que aí venham a decorrer, qualquer pagamento, a título de compensação ou indemnização, por eventuais prejuízos decorrentes da privação temporária do Estádio”, devendo ainda “conceder livre-acesso a todas as áreas do Estádio Municipal Cidade de Coimbra que irão servir de apoio à produção de eventos”.
De modo a garantir a execução do contrato-programa por parte da AAC/OAF, o Município de Coimbra vai constituir uma Comissão de acompanhamento e de monitorização para “acompanhar, numa lógica de proximidade, a boa utilização do equipamento desportivo” e “apurar se a manutenção e a conservação do Estádio está objetivamente a ser cumprida”.
“A CM de Coimbra continua empenhada em levar este processo, determinante para a cidade e para um clube histórico, a bom porto, sendo, naturalmente obrigada a cumprir escrupulosamente com a lei; a vontade política é total, mas o que está em causa é um problema jurídico, Lei é Lei, não é uma questão política”, refere o presidente da CM de Coimbra. “Temos procurado, ao longo de todo este processo, construir um diálogo colaborante e construtivo para ambas as partes, de forma a dignificar Coimbra e a AAC-OAF, cumprindo o novo balizamento jurídico”, conclui José Manuel Silva.
Importa recorda que o ECC, construído para o Campeonato Europeu de Futebol de 2004, foi concebido para servir a prática de futebol a nível profissional. A 29 de julho de 2004, após o Campeonato Europeu, o Município celebrou com a AAC/OAF, um “Acordo de Utilização do Estádio Cidade de Coimbra” que, em termos gerais, conferiu àquele organismo o direito de utilização do ECC “enquanto sede da prática desportiva profissionalizada da modalidade de futebol da AAC/OAF”; o direito de canalizar a seu favor todas as receitas ligadas à atividade desportiva desenvolvida no ECC (receitas de bilheteira, de exploração publicitária no Estádio, de alienação de “naming rights”); e, bem assim, todas as receitas provenientes da gestão e exploração dos espaços destinados a comércio, restauração e serviços. O Município de Coimbra, por seu lado, reservou para si “o direito de utilizar ou de ceder a terceiros a utilização do Estádio para a realização de qualquer evento, de carácter desportivo ou de outro teor, em datas e em condições a acordar […], bem como para o exercício e prática de formação de atletismo e judo…”.